Seguindo
as indicações do próprio texto, podemos esboçar um quadro comparativo entre a
Teoria Tradicional e a Teoria Crítica.
A
Teoria Tradicional é a que se encontra nas ciências especializadas, que
conhecemos desde a escola até as pós-graduações: Biologia, Física, Química. Nestas fica mais fácil
identificar a descrição que veremos mais adiante. Também se faz presente em
abordagens das ciências humanas como a História a Geografia e, podemos estender
à Matemática e à Linguística. Quais são, enfim, as características da Teoria
Tradicional?
Segundo
Horkheimer, a teoria tradicional
organiza a experiência à base da formulação de questões que surgem em conexão
com a reprodução da vida dentro da sociedade atual. Vamos desmembrar esta
última afirmação para ver o que conseguimos desenvolver a partir daqui...
A
experiência, ou seja, a apreensão que temos do mundo, sob influência da teoria
tradicional, já vem orientada por certas questões. Isso significa que não
lidamos com uma experiência direta das coisas, como gostaríamos de acreditar. As
questões que determinam nossas experiências com as coisas ou fatos estão em
conexão com a reprodução da vida na nossa sociedade.
Aqui
abro um pequeno parêntese para esclarecer o que pode significar essa “reprodução
da vida”, que é muito importante nesse contexto, já que é ela que determina as
questões que orientam nossas experiências. Citando um pequeno trecho de
Friedrich Engels (1820-1895), que se encontra no prefácio do livro Origem da família, da propriedade privada e
do Estado (ENGELS, 1953[1884]), veremos que “segundo a teoria materialista,
o fator decisivo na história é [...] a produção e a reprodução da vida imediata”
(p. 3). A produção e a reprodução da vida se apresentam em: 1) formas de
reprodução da espécie e 2) produção e reprodução dos meios de existência. Ou
seja, o sexo, as instituições em torno da reprodução da espécie como a família,
a religião, as leis civis; as relações de trabalho, de produção e distribuição
de bens, todas juntas, são o que
chamamos aqui de determinantes de nossa experiência.
Voltando
à Teoria Tradicional, por ela deixar de fora do seu sistema a gênese social das
questões que elabora, as situações reais e as finalidades perseguidas em suas
aplicações, acaba se preocupando apenas em produzir conhecimentos aplicáveis ao maior
número possível de ocasiões. Por isso, reproduz, sem perceber, as estruturas sociais
que a condicionam. Não leva em conta que essas condições todas estão na sua
base, desde a escolha do tema e sua delimitação à formulação do problema. Podemos
dizer que a Teoria Tradicional está alheia a – ou alienada de – suas próprias
motivações e estruturas de apreensão da realidade.
A
Teoria Crítica da Sociedade tem como objeto não o fato isolado, o dado
científico, mas justamente aqueles que produzem e reproduzem o conhecimento, ou
seja: o objeto da Teoria Crítica é constituído pelos homens como produtores de
todas as suas formas históricas de vida. Sendo assim, nem mesmo as ciências da
natureza estariam lidando apenas com fatos naturais, mas sempre com as relações entre seres humanos, em sociedade, exercendo seu poder sobre a natureza e sobre os próprios
homens.
A Teoria Crítica não trabalha com dados, pois eles nunca são apenas
dados, mas com situações, pois a situação é um conceito que designa um complexo de relações [esta ideia pode ser derivada das
influências da Gestalt sobre Horkheimer,
pois é também compartilhada por outro autor próximo da Gestalt, Kurt Lewin (1890-1947) (BLEGER, 1984)].
O problema
para a teoria crítica não é apenas constatar e prever segundo leis de
probabilidade. É preciso ir além da constatação e da suposta neutralidade
estatística. A Teoria Crítica busca compreender: não apenas o objeto, mas
também o sujeito, ou, seguindo mais de perto o texto, as formas de percepção; quais as
motivações subjacentes à formulação das questões de pesquisa; quais os sentidos
das respostas.
Em suma, a teoria crítica toma como objeto as relações de poder
subjacentes às atividades humanas, dentre elas, a ciência e suas
especialidades. Busca-se contextualizar historicamente os conhecimentos humanos
em relação às suas situações concretas de existência.
Assim
concluímos nosso estudo sobre o primeiro parágrafo, nossa próxima aventura
será, obviamente, fazer esse mesmo exercício com o segundo parágrafo!
REFERÊNCIAS
BLEGER,
José. Psicologia da conduta. Trad.
Emilia de Oliveira Diehl. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984.
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