sábado, 20 de outubro de 2012

FRAGMENTOS 2: Nietzsche, um psicólogo materialista e histórico, mas não dialético!



Olás, meus caros espíritos livres, já faz um bom tempo que não nos encontramos por aqui, não? Pois é, amigos imaginários, após alguns meses me dedicando a um novo projeto de pesquisa, consegui, enfim, voltar a escrever para o blog. Debrucei-me, desta vez, sobre o primeiro aforismo de Humano, demasiado humano. Nele, Nietzsche aborda um tema bastante psicológico: conceitos e sentimentos. Se fôssemos pensar em uma tradição outra, a freudiana, chegaríamos a uma analogia interessante aos correspondentes “representação” ou “ideia” e “afeto”. A semelhança vai além. Já não me recordo mais em que texto, Freud menciona sua esperança de que a química viesse substituir seu modelo de aparelho psicológico no futuro da ciência. Nietzsche dá a seu primeiro aforismo de Humano, demasiado humano o título de Química dos conceitos e sentimentos. Por quê?

O título do primeiro capítulo, que reúne 34 aforismos, talvez nos ajude: Das coisas primeiras e últimas. Trata-se de uma menção ao pensamento filosófico geral que busca compreender de onde vieram e para onde vão todas as coisas. Nietzsche inicia seu livro com uma grande crítica à metafísica. Segundo ele, os problemas filosóficos são os mesmos desde o começo, tentando compreender de onde se originam os opostos como racional/irracional, contemplação desinteressada/desejo, etc. A metafísica teria encontrado uma solução milagrosa para os opostos: as coisas de mais alto valor têm origem direta da essência. A metafísica, portanto, lida com valores, ou seja, julgamentos de valor, que se originam de algo para além do mundo físico e material: a essência. O que vem da essência tem um alto valor, o que não procede dela, baixo valor.

À metafísica, Nietzsche opõe a filosofia histórica que, para ele, é a ciência natural. Estaria ele pensando em termos de evolução biológica darwiniana? Não temos elementos neste aforismo para tirar alguma conclusão. O que nos interessa aqui é que ele afirma que a ciência natural, ou filosofia histórica, identificou um erro da razão na metafísica: não existem opostos, existem sublimações em que o elemento básico se volatiliza em sentimentos morais, religiosos e estéticos, também em todas as nossas emoções. O que é esse elemento básico? Como ele se volatiliza ou sublima em sentimentos e emoções? Para responder a essas questões, precisaríamos não recorrer a essências metafísicas, mas à observação aguda, ao método das ciências naturais, uma química das representações e dos sentimentos. Eis nosso filósofo que nega a metafísica pela explicação materialista (um elemento básico material), baseada em uma filosofia histórica, mas não na dialética hegeliana das ciências do Espírito.

Conclui o grande escritor com uma questão bem ao seu estilo: “e se essa química levasse à conclusão de que [...] as cores mais magníficas são obtidas de matérias vis e mesmo desprezadas? Haveria muita gente disposta a prosseguir com essas pesquisas?”. Será que queremos descobrir que o que consideramos mais elevado é só efeito ilusório da matéria vil? Diz ele que a humanidade não gosta de se aproximar de suas origens: “não é preciso estar quase desumanizado para sentir dentro de si a tendência contrária?”. A ironia dessa pergunta é genial! Estar humanizado, fazer parte da humanidade é conformar-se com as ilusões metafísicas. Buscar as verdades materiais e históricas dos seres humanos passa a ser, portanto, desumanizar-se. Eis uma explicação para o título do livro, que critica as ilusões demasiado humanas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário